quinta-feira, 23 de novembro de 2006

Uma filosofia para a tecnologia da informação, os modos de produção e o homem no século 21 (v1.0)

Uma filosofia para a tecnologia da informação, os modos de produção e o homem no século 21

Curitiba, 21 de novembro de 2006.

Por enquanto um copiar-colar de textos sobre tecnologia da informação, economia e mercado global, produção e filosofia.

Apenas a última parte é inédita – Consideração final, com algumas conclusões as quais não estão bem demonstradas - ainda!

Ricardo Mendes Junior. (Curitiba, 1958-) Analista de sistemas, Engenheiro Civil, Professor de Ensino Superior, Pesquisador em Desenvolvimento Tecnológico, Doutor em Engenharia de Produção e Sistemas.

A tecnologia da informação e o mercado global

Do telégrafo à Internet, toda nova tecnologia de comunicação acena com a promessa de reduzir distancia entre as pessoas, de aumentar o acesso à informacao, de nos aproximar cada vez mais do sonho de um mercado global de eficiência perfeita e sem restrições (entre nações). Todas as vezes em que isto ocorreu a sociedade, com urgência renovada, colocou-se o mesmo questionamento, e coloca agora novamente: até que ponto devemos nos omitir, "dançar conforme a musica" e fazer todo o possível para eliminar ainda mais ineficiências, ou remar contra a corrente e nos apegarmos a valores que os mercados globais não nos podem proporcionar?

Com a convergência de três fatores: (1) mercado (campo de jogo) global mediado pela web, (2) as novas práticas empresariais surgidas no mercado global e (3) a entrada para o mercado de novos indivíduos antes isolados e agora conectados pela web, teremos uma modificação no modo de os indivíduos se prepararem para o trabalho, de as empresas competirem, de os países organizarem suas economias e geopolíticas. Assistiremos a uma reestruturação. O modelo de criação de valor eminentemente vertical (baseado no comando e controle, hierarquias), até então predominante no mundo, começa a ser substituído por outro cada vez mais horizontal (de interconexão e colaboração). E não só as empresas são afetadas. Tudo o mais sofre as conseqüências: o modo de comunidades e empresas se definirem, como os indivíduos equilibram suas diferentes identidades de consumidores, funcionários, acionistas, cidadãos, qual o papel a ser desempenhado pelo governo. Tudo isso terá de se reconfigurar.

O que estamos fazendo

Citando na íntegra [1] texto de um filósofo:

[1] Com algumas palavras substituídas e que vou identificar após a citação.

"Todas as relações fixas, seguras, cristalizadas, com sua comitiva de antigos e veneráveis preconceitos e opiniões, são varridas, e aquelas recém-constituídas tornam-se obsoletas antes mesmo de se ossificarem. Tudo o que é sólido desmancha no ar, tudo aquilo que é sagrado é profanado, e o homem finalmente se vê compelido a encarar, com sobriedade, suas verdadeiras condições de vida e suas relações com seus pares. A necessidade de um mercado em constante expansão para seus produtos atormenta a sociedade civil em todo o planeta. Ela precisa imiscuir-se por toda parte, estabelecer-se em todos os lugares, forjar elos por todo lado. A exploração do mercado mundial pelas empresas permitiu-lhe conferir um caráter cosmopolita à produção e ao consumo em todos os paises, e, para profundo dissabor dos reacionários, ela puxou debaixo dos pés da indústria as bandeiras nacionais sobre as quais se erguia. Todas as indústrias nacionais ancestrais foram destruídas ou sofrem assaltos diários e vêem-se desalojadas por outras novas, cuja introdução se torna uma questão de vida ou morte para todas as nações civilizadas; por outras que já não utilizam matérias-primas locais, mas provenientes das mais remotas plagas; indústrias cujos produtos são consumidos não só em casa, mas em todos os cantos do planeta. Em vez dos antigos desejos, atendidos pela produção do país, deparamo-nos com novos anseios, para cuja satisfação se fazem necessários produtos de terras e climas distantes. Em vez do velho isolamento e auto-suficiência nacionais, temos o intercurso em todos os sentidos, a interdependência universal das nações. E, assim como no âmbito da produção material, também na esfera intelectual. As criações intelectuais de diferentes países tornam-se propriedade comum. A unilateralidade e a intolerância são cada vez mais inviáveis, e do sem-número de literaturas nacionais e locais emerge uma literatura mundial.

A sociedade global - burguesa, mediante o rápido aprimoramento de todos os instrumentos de produção, mediante os meios de comunicação imensamente facilitados, arrasta todas as nações, mesmo as mais bárbaras, para a civilização. Os baixos preços dos bens compõem a artilharia pesada com que ela derruba todas as Muralhas da China, com que força o obstinadíssimo ódio dos bárbaros aos estrangeiros a capitular. Ela compele todas as nações, sob pena de extinção, a adotar o modo de produção global; compele-as a introduzir em seu meio o que ela denomina de civilização, isto é, a se tornarem, elas mesmas, burguesas. Numa palavra, a burguesia cria um mundo à sua própria imagem e semelhança.

Difícil acreditar que este texto é de 1848, escrito por Marx.

As palavras substituídas foram: sociedade civil, normalmente traduzida como burguesia, mas que em alemãoo a mesma expressão (bürgerliche Gesellschaft (Santos, 2006); pelas empresas, onde seria "pela burguesia", para melhor representar o contexto atual (ou iludir o leitor!); sociedade global, também como burguesia – neste ponto introduzi o termo burguesia porque não tinha como evitar; produção global, onde seria produção burguesa, novamente para melhor representar o contexto atual.

A contribuição histórica de Marx

Como contraponto ao capitalismo, surgido no século 15 e com seu auge no século 19, e em decorrência do início da excludencia econômica e social que já era notória, surgiram no século 19 algumas correntes de pensamento com formulacoes filosóficas e econômicas importantes. Esse século foi, assim, marcado por grande efervescência intelectual, destacando-se importantes correntes de pensamento como, por exemplo, o idealismo de Friedrich Hegel (1770-1831), o socialismo utópico de Owen, Furier, Proudhon, o socialismo cientifico/comunismo de Marx e Engels, o anarquismo de Bakunin, etc.

Karl Marx, historiador, filósofo e economista, desenvolveu uma obra que conjugou magistralmente esses três ramos do pensamento humano e consubstanciou uma teoria que revolucionou as ciências sociais, econômicas e políticas e cujos fundamentos permanecem em grande parte validos até hoje. Os ideais socialistas já existiam antes de Marx. Com base na filosofia hegeliana e nesses ideais, ele partiu para a formulação do seu socialismo científico, mais conhecido como marxismo, mediante a negação da dialética do socialismo romântico. O produto mais acabado da teoria desenvolvida por Marx e seu amigo e parceiro Friedrich Engels (1820-1895) foi a teoria do comunismo, publicado em O Manifesto Comunista em 1848.

A face mais conhecida de Marx é indubitavelmente a de "economista" e sua obra mais conhecida é O capital, publicado em 1849. Contudo, Marx teve inicialmente formação de jurista e filosofo, e é isso que à primeira vista parece credenciá-lo como "filósofo" e de cujas idéias se pode falar. Mas essa percepção é equivocada. É justamente a descida de Marx às coisas da terra, às questões materiais que vai pô-lo como um filosofo de grande estatura e cuja "filosofia" não se pode ignorar.

No entanto, na verdade, a filosofia de Marx se constitui numa antifilosofia. Marx mostrou isso em duas pequenas obras: Teses sobre Feuerbach (1845) e A ideologia alemã (1846). O primeiro trata-se de 11 teses, algumas das quais sob a forma de aforismas, que preenchem sumarias quatro paginas e que se encerram com o seguinte e famoso mote: "Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras. O que importa é transformá-lo".

Na segunda obra, Marx conceituou o materialismo histórico (em contraposicao ao materialismo então existente), com o conceito de modo de produção:

"Pode-se distinguir os homens dos animais pela consciência, pela religião ou por tudo o que se queira. Mas eles próprios começam a se diferenciar dos animais tao logo começam a produzir seus meios de vida (o primeiro ato histórico dos homens, pelo qual se distinguem dos animais não é o fato de pensar, mas o de produzir seus meios de vida). (...) O modo pelo qual os homens produzem seus meios de vida depende, antes de tudo, da natureza dos meios de vida já encontrados e que têm de reproduzir. Não se pode considerar tal modo de produção de um único ponto de vista, a saber: a reprodução da existência física dos indivíduos. Trata-se muito mais de (...) determinada forma de manifestar sua vida, determinado modo de vida dos mesmos.

Para Marx as relações jurídicas, tais como formas de Estado, não podem ser compreendidas nem a partir de si mesmas, nem a partir do assim chamado "desenvolvimento geral do espírito humano", mas que, pelo contrario, elas se enraízam nas relações materiais da vida, e observa ainda que a anatomia da sociedade burguesa deve ser buscada na economia política.

No prefácio de Para a crítica da economia política (1858-59) Marx vai chegar à forma final do conceito de modo de produção: "Na produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e independentes de sua vontade, relações de produção estas que correspondem a uma etapa determinada de desenvolvimento de suas forças produtivas materiais. A totalidade destas relações de produção forma a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a qual se levanta a superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas determinadas de consciência. O modo de produção da vida material condiciona o processo em geral de vida social, político e espiritual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas, ao contrario, é o seu ser social que determina sua consciência".

Partindo do pressuposto de que o homem é um animal social, a produção da vida é para Marx um processo sempre social. Os homens, ao desenvolverem sua produção material e seu intercambio material, transformam também, com esta sua realidade, seu pensar e os produtos de seu pensar. o é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência. (...) As frases ocas sobre a consciência cessam, e um saber real deve tomar o seu lugar. A filosofia autônoma perde, com a exposição da realidade, seu meio de existência.

Por isso a filosofia de Marx é uma antifilosofia.

No pensamento econômico essa constatação leva a Marx a afirmar que o homem da sociedade da livre concorrência não é um ser a priori, um ideal que teria existido antes, e que criou a sociedade burguesa (como afirmaram Smith e Ricardo, economistas do século 18). Mas sim um produto, por um lado, da decomposição das formas feudais de sociedade e, por outro, das novas formas de produção que se desenvolvem a partir do século 16.

Na sociedade moderna o individuo isolado e independente, proprietário, livre e soberano, é uma ilusão e assimila essa ilusão à natureza do homem enquanto tal. Mas, ao contrario, esse homem é um produto da igualdade jurídica e da generalização da propriedade privada, com o advento desta sociedade moderna e da afirmação do modo capitalista de produção.

Consideração final

Se a tecnologia da informação criar uma nova estrutura de relações de produção entre as pessoas, como mostrado inicialmente, esta estrutura dará mais valor à colaboração do que à competição. Um exemplo disto, hoje em dia, são as comunidades que desenvolvem software livre.

Tendo como hipótese estas idéias de Marx, conclui-se (?) que poderemos ter como conseqüência a formação de um novo homem social. Um homem mais colaborativo, solidário, liberto de idéias como direitos autorais, direito de propriedade, etc. Este novo homem formará uma nova sociedade aonde os bens e os recursos são do planeta e devem ser explorados em modos de produção que mantenha o planeta em equilíbrio – um modo de produçã o sustentável.

Karl Marx

Tréveris (Alemanha), 5 de maio de 1818 – Londres, 14 de março de 1883

Portanto produziu os textos citados entre os 27 e 41 anos. Casou-se aos 25. Teve cinco filhos com sua esposa, dos quais três morreram na infância. Sua vida sempre foi em péssimas condições financeiras (o que deve ter causado a morte dos seus filhos), mas procurou casar bem suas filhas, inclusive proibindo uma delas de casar-se com um revolucionário comunista francês. Teve um filho fora do casamento, o qual arranjou para que fosse reconhecido como filho por Engels.

Segundo Engels em discurso quando da morte de Marx, Marx foi o homem mais odiado e mais caluniado de seu tempo. Mas ele não tomava conhecimento das difamações, só respondendo quando a necessidade extrema o compelia a tal. E morreu amado, reverenciado e pranteado por milhões de pessoas, e embora, possa ter tido muitos adversários, não teve nenhum inimigo pessoal.

Bibliografia

Os pensadores um curso. Mario Vitor Santos (Org.) Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2006

E se o capitalismo acabasse? Ensaio para um sistema sóciopolítico e econômico que exercita a democracia e recupera a essencialidade humana. L. C. Correa Soares. Curitiba: O Autor: 2001.

O mundo é plano: uma breve historia do século XXI. Thomas Friedman, tradução de Cristiana Serra e S. Duarte. Rio de Janeiro: Objetiva, 2005.

Karl Marx. Wikipédia, a enciclopédia livre. http://pt.wikipedia.org/wiki/Karl_Marx.